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Vila Soma e Lutas Urbanas no Brasil

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01/02/2016

Por: Fernando Cézar Macedo*

No dia 13 do mês passado, o presidente do Supremo Tribuna Federal (STF) Ricardo Lewandowsky suspendeu a reintegração de posse do terreno onde se localiza a ocupação Vila Soma, em Sumaré (SP), marcada para o dia 17 de janeiro. Foi uma importante conquista das mais de duas mil famílias que estão lá desde 2012. Embora provisória, a liminar concedida por Lewandowsky possibilita aos moradores da Vila Soma e sua coordenação mais tempo para negociarem com as autoridades competentes a solução do impasse em torno de suas demandas habitacionais. Também diminui o clima de tensão, dado o eminente perigo de uma ação policial com consequências imprevisíveis, como já visto anteriormente em casos similares, conforme amplamente destacado nos meios de comunicação. 

Aliás, este foi um dos argumentos usados pelo presidente do STF ao proferir a decisão, ao lembrar da necessidade de pacificação de conflitos sociais em situações como essa, “em especial quando é levada a efeito por força policial desacompanhada de maiores cuidados com o destino das pessoas retiradas”. O exemplo da ocupação de Pinheirinho, em São José dos Campos (SP), em janeiro de 2010, é o mais emblemático destes episódios cujo desfecho lamentável, após truculenta ação da PM, está bem vivo em nossas memórias e mereceu condenação de importantes organismos internacionais.

A Vila Soma sintetiza as lutas urbanas que diversos movimentos sociais travam no Brasil. Sem dúvida, o direito à moradia é o mais significativo, pela segurança e estabilidade que a casa própria oferece aos trabalhadores e às trabalhadoras, em um país no qual a vida dos mais pobres é marcada por constante incerteza e risco. Mas não é a única. Em janeiro de 2016, assistimos em diversos lugares do país manifestações contra os ajustes no preço das passagens de ônibus cujo resultado imediato é o aumento no custo de deslocamento para a classe trabalhadora. Na ausência de uma política séria de mobilidade urbana, o ônus sempre recai sobre os mais pobres, mantendo intocados os carteis das empresas de transporte coletivo cuja oferta de serviços em nossas cidades está muito abaixo do minimamente aceitável. Não obstante, políticas de estímulo à produção de automóveis são fartamente estimuladas, ainda que o lucro das montadoras localizadas no Brasil seja recorrentemente enviado para suas matrizes no exterior. 

Desnecessário alongar a lista das demandas urbanas ainda não atendidas em nosso país, ou mal atendidas, pois é de conhecimento geral: saneamento básico, coleta de lixo, iluminação, saúde pública, política cultural e de lazer, escolas de qualidade (vide a luta dos estudantes paulistas que imputaram ao tucanato bandeirante significativa derrota em dezembro de 2015, ao barrar o projeto de reestruturação escolar do governo estadual) etc. Enfim faltam serviços e infraestrutura que garantam o direito à vida digna na cidade para uma parcela significativa da população. Na ocupação em Sumaré, falta qualquer desses serviços de utilidade pública. Não por acaso, a rede de apoio à Vila Soma conta com dezenas de movimentos e entidades que expressam essa insuficiência do poder público, em seus três níveis de governo. 

Um outro aspecto que deve ser ressaltado é o caráter eminentemente político para a solução do problema das ocupações. Difícil imaginar uma saída que não passe pela articulação das ações dos governos municipal, estadual e federal com diálogo direto com a coordenação do movimento dos moradores. No ato de apoio à Vila Soma, ocorrido em 16 de janeiro, apenas o governo federal enviou representantes. Não é de se estranhar visto que a posição do governo estadual tem sido de relativa omissão, escondido sob o manto legalista de que cabe a ele apenas acatar as ordens judiciais. Nas palavras do governador paulista, “há necessidade de cumprir a decisão judicial, porque decisão judicial se cumpre. A justiça não vai desistir da reintegração. Vai mantê-la.” (JORNAL CORREIO POPULAR, Campinas (SP), p. A8, 18/01/2016). Legalismo, neste caso, é ficar no compasso de espera enquanto a liminar é suspensa e o direito ao terreno onde se encontra a ocupação fica garantido aos seus proprietários, mesmo que a terra não cumpra função social. Boa vontade seria indicar, objetivamente, as ações concretas que ficariam a cargo do executivo estadual para superação do impasse.

Do executivo municipal, não há o que esperar de positivo. A prefeita de Sumaré já se manifestou várias vezes contrária a qualquer solução do problema e se exime da responsabilidade. Um dos argumentos é que o terreno é particular e que a prefeitura não é a responsável pelo pedido de reintegração de posse. Portanto, joga a responsabilidade para os proprietários do imóvel. Pior, em nota, a administração municipal afirma que “a Prefeitura de Sumaré continua defendendo que a melhor solução para o problema seria cada cidade ou Estado de origem de cada família que está na área da Soma incluir estas pessoas em seus próprios projetos de atendimento habitacional. Os único entes públicos capazes de realizar tal articulação são os governos federal e do Estado” (JORNAL CORREIO POPULAR, Campinas (SP), p. A9, 18/01/2016).

Nesta nota oficial da prefeitura, fica evidente a visão absurdamente frágil e torpe de como é pensado o papel do poder público municipal num país federativo como o nosso: 1) defesa da ideia de que os moradores da ocupação são problema de suas cidades e estados de origem; 2) omissão do poder local em cumprir com suas tarefas, pois, se é parcialmente verdade que a prefeitura sozinha não poderia resolver o problema habitacional, é fato que é no município que esse problema se manifesta concretamente. Portanto, caberia a prefeitura fazer a articulação com os governos federal e estadual e receber a coordenação dos moradores do Vila Soma, coisa que nunca aconteceu. Ou seja, enquanto as prefeituras do país disputam freneticamente entre si frações de capital para investimentos em seus territórios concedendo-lhes benesses públicas (a tão conhecida “guerra fiscal), independente da origem deles, negam a seus naturais e a brasileiros de outras procedências o direito à cidade.

Por estas razões, a luta da Vila Soma é a luta urbana de todos nós.

*Professor do Instituto de Economia da Unicamp, Doutor em Ciências Econômicas

Eliezer Batista Ligou A Vale Ao Resto Do Mundo

Galgando vários postos ao longo de sua carreira, até ser nomeado presidente da mineradora coube a ele transformar..


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